Carlos Newton
Existe um ditado, muito real, que cabe como uma luva e pode ser aplicado ao surrealismo que caracteriza a política brasileira – a teoria, na prática, é outra. Muitas vezes, por exemplo, somos surpreendidos com decisões do Supremo Tribunal Federal que tornam obrigatório seguir determinadas orientações teóricas que na prática não significam nada, rigorosamente.
Nesta quinta-feira (dia 2), o STF decidiu que as investigações criminais do Ministério Público devem seguir os mesmos prazos e regras já estabelecidos para a conclusão de inquéritos policiais. É uma determinação não traz nenhuma novidade ao front ocidental, porque apenas reafirma a analogia que supre possíveis brechas da lei.
MAIS DO MESMO – Além disso. sempre que algum integrante do Ministério Público abrir um procedimento investigatório, ele deve informar imediatamente ao juiz, assim como o encerramento do caso também deve ser logo comunicado.
Para evitar investigações paralelas, pelo Ministério Público e pela Polícia, as apurações deverão ser supervisionadas por um mesmo juiz. Assim, o primeiro magistrado que for acionado em determinado caso por qualquer um dos órgãos (MP ou Polícia), deve assumir também o outro procedimento, caso estejam apurando os mesmos fatos.
Realmente, nada de novo. Teoria e prática se coadunam. Mas o que nos intriga é que há outras implicações quando são comparadas diferentes situações.
LUTA CORPORAL – Conforme a decisão do plenário do STF, o Ministério Público está submetido à “observância dos mesmos prazos e regramentos previstos para conclusão de inquéritos policiais”.
Bem, é aí que a teoria entra em luta corporal com a prática. Quer dizer que a Suprema Corte reconhece que existem “prazos e regramentos previstos para conclusão de inquéritos policiais”, mas esquece de impor prazos quando a investigação é conduzida em sua própria jurisdição?
É claro que estou me referindo àquele famoso inquérito que já completou cinco anos em aberto. Foi iniciado em 2019, por determinação ilegal do então presidente do STF, Dias Toffoli, que também ilegalmente entregou o inquérito ao ministro Alexandre de Moraes. Tornou-se uma investigação destrambelhada, que não termina nunca e foi apelidada de “inquérito do fim do mundo” pelo ministro aposentado Marco Aurélio Mello.
ATÉ MUSK – A investigação foi aberta para conter as informações sobre sonegação de Imposto de Renda pelas mulheres de Toffoli e Gilmar Mendes, juntamente com fake news.
Os autos foram crescendo, incorporaram as milícias digitais, as ofensas do deputado Daniel Silveira, que acabou preso e cassado, e até as denúncias do empresário americano Elon Musk. É um nunca-acabar, tipo coração de mãe, onde sempre cabe mais um.
Isso tem de acabar, mas o Supremo, em sua soberba de nariz empinado, jamais olha para os pés de barro em que se atola. Prefere criar normas práticas que se tornam meramente teóricas e esquece de evitar irregularidades em suas próprias rotinas.
P.S. 1 – É uma constatação triste. Como é que o Supremo chegou a esse ponto de permitir censura exercida em suas próprias dependências?
P.S. 2 – Não importa se a censura vem a pretexto de defender a democracia ou a educação dos meus netinhos, não há justificativa. E o pior é saber que foi preciso haver a intervenção de um empresário estrangeiro para a censura ser assim caracterizada. É desalentador.