Voltando de Londres, depois da renúncia à Presidência da República em agosto de 1961, Jânio surpreendeu mais uma vez o país lançando-se candidato ao governo de São Paulo contra Adhemar de Barros e José Bonifácio Nogueira, candidato de Carvalho Pinto.
Jânio saiu numa campanha forte, responsabilizando as “forças terríveis” que haviam levantado um muro diante de seu plano de governo. O slogan do publicitário, depois deputado, João Dória era a síntese do esquema da campanha: “A renúncia foi uma denuncia”.
Ademar, contido a duras penas pela sua assessoria política e publicitária, mudou o velho tom, bonachão mas duro. Não atacava Jânio, não falava na renúncia, pregava a paz e a tranquilidade para um Estado ainda traumatizado pelo gesto do ex-presidente, que deixara o país e sobretudo São Paulo deserdados pela renúncia.
A campanha ia chegando ao fim. Jânio crescendo nas prévias eleitorais, Ademar impaciente, mas obedecendo ao staff. No comício de encerramento, em São Carlos, explodiu. Deixou de lado os conselhos e o projeto de discurso discutido com a assessoria e voltou ao velho tom, direto, irreverente, aberto, cara a cara com o povo. Foi um sucesso:
– Povo de São Paulo, eu não aguento mais. Esse homem é maluco. Ele vai botar o professor Carvalho Pinto na cadeia. Ele vai me botar na cadeia. Outra vez! Meu Deus, lá vou eu de novo para a Bolívia!
Estava em lágrimas. Ganhou por 30 mil votos. Com aquele discurso.
No meio dessa campanha de 1962, em que se candidatou pela segunda vez ao governo de São Paulo contra Ademar, o vice de Jânio era o brigadeiro Faria Lima. Laudo Natel saiu candidato sozinho, em faixa própria. Parecia clara a vitória de Jânio e de Faria Lima.
Amador Aguiar, o homem do Bradesco, telefonou para o ex-presidente e marcou encontro na casa de um funcionário do banco. Queria que Jânio retirasse a candidatura Faria Lima para apoiar Laudo, diretor do Bradesco e presidente do São Paulo Futebol Clube:
– Dr. Jânio, sei que sua campanha está com muitas dificuldades financeiras. Poderíamos resolver o assunto e assim seriam eleitos o senhor e o Laudo, que eu trouxe comigo para o senhor conhecer pessoalmente.
– Meu caro, já estou eleito. O povo já manifestou sua preferência. Mais uma vez, Dr. Amador. Vou ganhar em São Paulo e em todas as grandes cidades. Nem vou mais às pequenas, porque não precisa. Está na hora de ver quem é ou não é meu amigo, para não haver queixas depois.
– Mas, presidente, o Laudo está mais forte do que o Faria Lima. Juntos, daremos uma surra no Ademar.
– Não posso, meu caro. Não posso trair o Faria, que é meu amigo dileto. Di-le-to, entendido?
Na ponta da mesa, baixinho, caladinho, ao lado de José Aparecido, Laudo não tugia nem mugia. Jânio chamou-o para sentar-se mais perto:
– Doutor Laudo, o senhor já foi candidato antes a alguma coisa?
– Não, presidente. Não gosto de política. Foi seu Amador que mandou. Abaixo de Deus, é o pai que eu conheci.
– Mas de futebol o senhor gosta. É presidente do São Paulo.
– Também não gosto de futebol, presidente. Foi seu Amador que mandou. Abaixo de Deus, foi o pai que conheci. O senhor não imagina o homem bom que ele é.
O acordo não foi feito. Jânio perdeu por 30 mil votos (das pequenas cidades que não visitou). Laudo (quer dizer, seu Amador, o pai que ele conheceu) ganhou para vice. E Ademar se elegeu governador.