J.R. Guzzo
Estadão
As manifestações de massa do último domingo na Avenida Paulista deixaram perfeitamente óbvio, mais uma vez, que já está mais do que na hora do Brasil resolver a questão de Jair Bolsonaro. O ex-presidente, queira-se ou não, é uma força política de primeiro grau – uma dessas realidades a que todas as democracias estão sujeitas, e que têm de ser tratadas unicamente com soluções democráticas. É um risco inseparável da existência de qualquer democracia.
Na política, surgem, por razões múltiplas, lideranças que muita gente julga indesejáveis para o bem comum. Se não há esse risco, não há democracia. A única resposta real é mostrar racionalmente para a maioria que essa pessoa é nociva – e, em seguida, derrotá-la em eleições livres.
SOLUÇÃO DITATORIAL – O verdadeiro perigo representado hoje por Bolsonaro é servir de justificativa, ou de desculpa, para se trocar a solução democrática e custosa pela solução ditatorial e fácil. Para o PT e a esquerda radical, isso não é problema nenhum. Nunca, nem uma vez, aceitaram uma derrota eleitoral.
Repetem, há quase 40 anos, exatamente a mesma coisa: “fora Collor”, “fora FHC”, “fora Temer”. Agora estão no “fora Bolsonaro”. Como ele está proibido pelo TSE de disputar eleições até 2030, o próximo “fora” vai ser para quem aparecer na sua frente, seja lá quem for.
Mas para os brasileiros que defendem a democracia como a melhor forma de se viver em sociedade, e não querem submeter-se à política da gritaria, admitir que Bolsonaro seja ilegalmente eliminado da vida pública brasileira é aceitar um copo de veneno. Não é uma exceção para se salvar o bem comum. É um incentivo ao mal comum.
UM FALSO PERIGO – Não pode haver democracia se um grupo de burocratas que nunca recebeu um voto na vida decreta, alegando a lei eleitoral e truques judiciários, quem está autorizado a participar da disputa política.
Não faz sentido, em nenhuma democracia séria, que o único político do país capaz de levar mais de meio milhão de pessoas para a rua seja um perigo – e que não possa ser uma opção para quando os cidadãos escolhem seus governantes.
A anomalia fica especialmente grosseira quando se considera que o presidente da República, o principal inimigo e acusador de Bolsonaro, não consegue reunir público nem para uma mísera “live”; sair à rua, então, está fora de qualquer cogitação há anos.
QUEREM PRENDÊ-LO – Lula e o seu sistema dizem que estão fazendo o melhor governo que o Brasil já teve – e Bolsonaro, segundo garantem, foi e será sempre o pior governante do mundo. Qual o problema, então? É só fazer uma eleição; o povo mandaria o ex-presidente para o espaço e tudo estaria resolvido.
Mas a livre competição política está abolida no Brasil de hoje. Não querem derrotar Bolsonaro no voto. Querem se livrar do problema jogando o concorrente na cadeia – com acusações patentemente ineptas e que seriam recebidas com uma gargalhada em qualquer tribunal do mundo democrático.
É um erro. Bolsonaro não vai desaparecer da realidade nacional com atos administrativos do ministro Alexandre de Moraes, e muito menos com os desejos do governo.