Pedro do Coutto
O governo anunciou ontem, através do ministro Fernando Haddad, que o programa “Desenrola” será iniciado a partir de julho, beneficiando 30 milhões de pessoas cujas dívidas vão até R$ 5 mil. A medida vai causar efeito na circulação de dinheiro nas áreas comerciais e bancárias onde as dívidas se concentram. Os inadimplentes vão respirar aliviados, mas na minha opinião, esse alívio durará pouco porque eles pagarão juros à Caixa Econômica ou ao Banco do Brasil na escala de 1,99% ao mês.
Esta face do programa foi destacada na manhã de ontem pelo jornal da TV Globo por Eraldo Pereira e Miriam Leitão. Isso de um lado. De outro, o governo vai zerar as dívidas de até apenas R$ 100 que incluem surpreendentemente 1,5 milhão de homens e mulheres. Certamente, é lógico, o governo assumirá o encargo junto aos credores. No caso da inadimplência até R$ 5 mil, situam-se, como Fernando Haddad informou, 30 milhões de pessoas. Falta esclarecer a quem essas 30 milhões de pessoas vão pagar os juros mensais de 1,99%.
INADIMPLÊNCIA – Presumo que à CEF ou ao Banco do Brasil. Só existem os dois caminhos. Agora, os juros de 1,99% numa escala anual, incluindo os montantes, juros sobre juros, significam algo em cerca de 30%. Os salários não sobem 30% a cada 12 meses, portanto, apaga-se uma inadimplência e abre-se o caminho para outra, pois, conforme sempre sustento, a saída para qualquer problema social e econômico depende somente da existência de emprego com salários que não percam para a inflação.
No caso em pauta, os juros anuais de 30% tornam impossível o resgate das dívidas sem que sejam feitas outras dívidas em outros bancos e lojas porque o cadastro na Serasa ficará zerado. Matheus Teixeira e Idiana Tomazelli, em reportagem na Folha de S.Paulo desta terça-feira, focalizam o assunto. No O Globo, a reportagem é de Manuel Ventura, Vitória Abel, Renan Monteiro e Elaine Oliveira.
FINANCIAMENTO – O governo está lançando também o programa de financiamento parcial para a aquisição de carros, ônibus e caminhões. O sistema é mais complicado e inclui leilões para a aquisição de veículos com maior desconto oferecido pelas montadoras. Há um bônus de R$ 8 mil, mas é preciso incluir na equação a parte que cabe às comercializadoras de veículos, há menos que as montadoras realizem vendas diretas, o que não é provável. Logo, como se constata, uma parte do projeto ainda não foi equacionada.
Trata-se de uma iniciativa popular, mas da mesma forma que a operação “Desenrola” que à primeira vista reflete bem na opinião pública, mas não estão ainda traduzida por completo , incluindo os seus efeitos no ambiente comercial e no poder de compra da população.