Fabiano Lana
Estadão
Pesquisa Quaest divulgada nesta quarta-feira, dia 10, mostra que Lula conta com 36% de ótimo e bom, 30% de regular e 30% de ruim e péssimo. Embora indiquem um avanço, o presidente Lula deve estar achando péssimo o resultado, diante de suas recentes declarações em visita a Diadema (SP), este mês, na qual foi explícito no messianismo e afirmou que ele é “o povo na presidência da República”.
O que se viu no pronunciamento de Lula foi um longo autoelogio no qual argumenta que, por sua trajetória única, pode se considerar o dirigente mundial mais capaz de conduzir sua população – talvez em todos os tempos.
MELHOR MOMENTO – Para a plateia favorável, ele afirmou que vive o melhor momento de sua vida política, mesmo que não viva a fase mais popular de sua trajetória.
“Quando deixei dia 31 de dezembro o meu mandato, eu tinha 87% de bom e ótimo. Eu tinha 10% de regular e eu tinha 3% de ruim/péssimo. Nunca antes na história do país um presidente terminou tão bem. Agora o mundo político mudou. A coisa está mais polarizada”, lamentou.
Logo depois ele lembrou que no começo de seu mandato, em 2003, foi convidado para ir à cidade de Evian, na França, para a cúpula do G7, o grupo de países mais ricos do mundo. “Eu fui o primeiro presidente do Brasil e da América Latina a ser convidado a participar da reunião em Evian”, se gabou.
CHEGA BUSH – No dia do encontro, segundo o relato do presidente, todos os mandatários se levantaram para receber o então presidente americano George Bush, menos ele.
“A gente não vai levantar. Por respeito a nós mesmos. Ninguém levantou quando nós chegamos. Por que que a gente vai levantar para o Bush?”, teria dito ao então chanceler Celso Amorim. “Aconteceu uma coisa fantástica. O Bush sai da mesa de cumprimento dos outros e vai sentar exatamente na mesa que eu estava com o Celso Amorim e com o Kofi Annan (secretário geral da ONU). Qual é a lição que eu tenho disso? Ninguém respeita quem não se respeita. Se você se respeitar, todas as pessoas te respeitam”.
Mas o grande aprendizado, segundo Lula, veio mais tarde. O presidente brasileiro teve uma espécie de epifania no evento. Entre todos os chefes de Estado lá presentes, da Inglaterra, da Itália, da Arábia Saudita, da Alemanha, ninguém contava com uma vivência tão significativa como ele próprio das dificuldades da população.
DISSE LULA -“Porra, eu tô vendo esses presidentes, tudo gente famosa na televisão. Tô vendo todo mundo lá. Será que alguns caras desses já passaram fome? Será que algum cara desse já ficou desempregado? Será que um cara desse já viu a casa dele encher d’água e colocar sanguessuga na sua canela e lesma na parede? Veio cocô boiando, barata tentando se salvar e rato? Não, nenhum deles. Eu já tinha”.
Daí, após essa declaração imponente, o presidente Lula concluiu o discurso com o aforismo que pode ficar célebre como um dos grandes momentos do populismo brasileiro:
“Porque eu descobri que eu não sou eu. Eu descobri que eu sou vocês. E é vocês que estão na Presidência da República desse país. É o povo. É o povo que pela primeira vez teimou, teimou”.
O NÚMERO UM – O que Lula deixou revelar sobre si mesmo em Diadema? Que tem a completa convicção do que a população brasileira (e talvez a mundial) precisa e como lidar com isso. Que ninguém pode ser melhor que ele. Não tiveram sua vivência, não tiveram sua trajetória, não sabem como vivem os mais miseráveis de seus povos.
Em certo sentido Lula tem razão. Seu itinerário de vida do agreste pernambucano, das periferias de Santos, das lutas sindicais até a presidência da República, da prisão, e novamente presidência, é realmente admirável, talvez inigualável.
Mas Lula não é o primeiro da história mundial que prosperou politicamente chegando de muito baixo. Há até casos paradoxais que o contradizem. Em Cuba, Fidel Castro, de família próspera, derrubou um ditador mestiço de origem humilde, Fulgêncio Batista, que havia sido cortador de cana antes de se tornar sargento.
Já Franklin Roosevelt, o presidente que enfrentou e venceu não só a II Guerra, mas também a depressão americana, retirando milhões da pobreza, era um nova-iorquino de família abastada com outra passagem na Casa Branca.
OUTROS EXEMPLOS – Mesmo no Brasil já tivemos presidentes de origem humilde, como Nilo Peçanha, também mestiço (alguns o consideram o nosso primeiro presidente negro), descendente de pequenos agricultores, e mesmo Juscelino Kubitschek. Sua terra natal, Diamantina, era decadente e isolada no começo do século 20.
A presunção de Lula é achar que ninguém pode ser comparado a ele, ninguém pode superá-lo. E, mais perigoso, em seu terceiro mandato, é pensar que ninguém pode confrontá-lo, contraditá-lo, questioná-lo.
Ter vivido o que viveu não o torna infalível porque ninguém o é. Como sonha em ter de volta a quase unanimidade já obtida em 2010, e não tem nem a metade daqueles números, que a soberba não prenuncie a ruína.
UM MINUTO POR FAVOR – Caraca! Além de ter um Supremo inerrável, que pela Súmula 606 eliminou qualquer possibilidade de recurso contra decisão errada dos ministros, mesmo que seja monocrática, agora temos também um presidente inerrável, o melhor do mundo, primus inter pares, como se dizia na Roma Antiga, que nem consegue resolver os problemas do Brasil, mas não permite ser comparado a outros governantes daqui e do exterior. Em matéria de vaidade, portanto, Lula realmente é o número um. Mas como ser humano, é apenas um ex-presidiário, condenado dez vezes por corrupção e lavagem de dinheiro, cujo desequilíbrio mental é cada vez mais evidente.