Malu Gaspar
O Globo
Impressionou os políticos do PL o assédio dos bolsonaristas que foram ao clube de Brasília onde estava sendo realizado o jantar promovido pela sigla. Eles cobraram o presidente do partido, Valdemar Costa Neto, e o próprio presidente da República, para que se dirija aos manifestantes que participam dos protestos nas portas dos quartéis.
“A população tá apoiando ele (Bolsonaro). O ladrão não vai subir a rampa”, disse um seguidor bolsonarista, em referência ao presidente eleito Lula, enquanto Costa Neto tentava se esquivar. “O presidente é homem, pode ter certeza que ele não vai deixar vocês na mão”, respondeu o dirigente a um deles.
SILÊNCIO E LUTO – A certeza exibida por Costa Neto, porém, não reflete o esforço para que Bolsonaro encerre seu período de silêncio e luto pela derrota. Desde que o resultado das eleições foi anunciado, o chefe do PL tem tido conversas frequentes a sós com o atual presidente, nas quais insiste para que Bolsonaro saia do imobilismo e comece a organizar a oposição.
Na terça-feira mesmo, antes do jantar, os dois passaram uma hora reunidos no Palácio do Planalto. O resultado dessas conversas, segundo Valdemar relatou a aliados, é que Bolsonaro já concordou em falar publicamente. A questão, porém, é o que ele deve dizer e quando fazê-lo.
No círculo mais próximo do presidente, há uma grande preocupação com a resiliência demonstrada pelos atos golpistas, que continuam bloqueando algumas estradas e mantêm grupos numerosos nas portas dos quartéis. Em alguns locais, como no Mato Grosso, manifestantes continuam fechando estradas e queimando ônibus, no que ministros do Supremo têm definido como atos terroristas.
DESMOBILIZAÇÃO – Os interlocutores desses magistrados na Esplanada dos Ministérios têm inclusive transmitido ao presidente a pressão que vêm recebendo de membros da corte para que o Bolsonaro desmobilize os manifestantes antes de deixar o governo.
Mas o presidente derrotado, que se recusa a pedir que seus seguidores suspendam os atos golpistas, também sabe que não há mais o que fazer para tentar reverter o resultado das eleições. A última alternativa jurídica – a ação do PL pedindo a revisão de parte dos votos do segundo turno – já foi rejeitada pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral, e não há chance de intervenção das Forças Armadas.
“O dilema é que ele mandou o povo para a rua e agora não pode dizer a eles simplesmente que saiam”, resume um dos aliados pessoais mais próximos do presidente.
AGRADECIMENTO – Até agora, esse grupo mais chegado já sugeriu que o presidente agradeça a votação recebida nas eleições e a mobilização dos seguidores, mas diga que chegou a hora de lutar em outras frentes.
Num discurso a ser feito em alguma ocasião pública ou mesmo em uma live, Bolsonaro poderia dizer que perdeu a batalha, mas que a guerra continua – e convocar seus seguidores a ajudá-lo a resistir no Congresso contra “o comunismo”. A partir daí, ele partiria para uma sequência de atos públicos e viagens pelo país para manter a base coesa e motivada.
Apesar de todo o esforço de Costa Neto e outros aliados, porém, Bolsonaro só diz que falará em breve. Mas nem no jantar do PL, onde foi paparicado com pedidos para fotos e discursos públicos de homenagem, ele se animou. Entrou mudo e saiu calado. Segundo Valdemar descreveu nos bastidores para alguns interlocutores, o presidente está melhor, mas ainda não “recebeu alta”.
NOTA DA REDAÇÃO DO SITE – O problema é que os interesses de Costa Neto e dos políticos do PL são totalmente diferentes dos interesses de Bolsonaro. Entanto o partido se preocupa em seguir em frente e assumir a liderança da oposição a Lula, o presidente ainda sonha com o golpe militar e conseguiu o surpreendente apoio dos comandantes militares, conforme comentamos no artigo publicado de manhã cedo. Ao contrário do que se pensa, o golpe está mais vivo do que nunca. Bolsonaro não se preocupa com as consequências, apenas com seus próprios interesses. Enquanto isso, o filho Zero Três continua conspirando lá no Catar, onde por coincidência a seleção brasileira disputa a Copa. A Mesa da Câmara informou ontem que a “viagem oficial” será de 12 dias.