Hélio Schwartsman
Folha
O diretor Jean-Luc Godard é mais um que optou pela morte assistida na Suíça. Godard estava com 91 anos e, segundo um amigo ouvido pelo jornal Libération, não estava doente, apenas exausto de viver, e decidiu partir em seus próprios termos. Também do mundo das telas, o ator Alain Delon pretende seguir o mesmo roteiro, mas ainda não consumou o ato.
Delon está com 86 anos, mas sofreu um AVC, que lhe roubou muito da qualidade de vida. As pessoas devem ser livres para dispor de suas próprias vidas?
EXPANSÃO DOS DIREITOS – Eu não vejo como responder negativamente a essa pergunta. Pelo menos no Ocidente, estamos, desde o século 17, num movimento de ampliação do conceito de indivíduo.
Essa ideia fincou raízes na modernidade e vem sendo expandida. No que diz respeito a direitos, a coisa surgiu até de forma discreta, com a caracterização de algumas garantias básicas, como a liberdade de expressão e o devido processo legal, mas o processo de expansão nunca cessou.
A maioria dos países desenvolvidos já assegura à mulher o direito de abortar uma gravidez a pedido. Vai crescendo rapidamente o número de nações que está descriminalizando ou legalizando o uso de drogas.
ÚLTIMA FRONTEIRA – Curiosamente, a morte é a última fronteira. Embora o direito de interromper a própria vida, via eutanásia ou morte assistida, esteja entre os mais intuitivos e tenha muito menos impacto sobre terceiros do que os anteriores, contam-se nos dedos os países que os autorizam. Não há razão, porém, para acreditar que a lista não irá crescer, como ocorreu com o aborto e as drogas.
A ideia de indivíduo não tem seu alcance restrito a direitos. A ela podemos ligar pelo menos parcialmente várias “invenções” da modernidade, como a livre iniciativa na economia e a autonomia, incluindo a percepção de que cada qual é livre para escolher o tipo de vida que quer levar e o responsável por dar sentido para ela. Isso é ao mesmo tempo libertador e assustador.