Vinicius Torres Freire
Folha
“LULA PRESIDENTE”. “Metalúrgico é o primeiro líder de esquerda a ser eleito no país”. Eram as manchetes desta Folha na eleição de 2002. Lula deixara o sindicalismo havia quase 20 anos, mas aparecia ainda como operário. Centrais e sindicatos declinavam, mas manteriam alguma presença na vida política ou nas ruas até a Grande Recessão (2014-16).
No 1º de Maio de 2010, Lula apresentava Dilma Rousseff como sua sucessora. Os dois foram também à festa da Força Sindical (rival da CUT, lulista, mas então aliada do governo).
A manifestação, com shows e sorteios, teria juntado mais de 450 mil pessoas, segundo a PM, e foi patrocinada por empresas estatais e privadas. A popularidade de Lula passaria de 80% no final daquele ano.
14 ANOS DEPOIS… -No 1º de Maio deste 2024, Lula irritou-se em público por causa do fiasco da festa. No estádio do Corinthians, o Itaquerão, havia umas 2.000 pessoas.
O vexame em si não tem importância, embora tenha feito a alegria da extrema direita nas redes. O sindicalismo definha no Brasil faz tempo. A notícia trabalhista mais importante das últimas semanas, de resto, é o fracasso da regulamentação do trabalho dos motoristas de aplicativo, que criticam o projeto do governo e têm aversão a sindicato.
Mais impressionante, embora impressão velha já quase de uma década, é a extinção da esquerda nas ruas. Nem mesmo as causas que já foram célebres da antiga esquerda comovem manifestantes.
DINOSSAURO EXTINTO – Em abril de 2017, as centrais sindicais ainda conseguiram levar gente para protestos e promover greves contra a reforma da Previdência, movimento que também expressava raiva contra a pobreza dos anos recessivos. Foi a última vez em que esse dinossauro foi visto.
A reforma trabalhista de Michel Temer, de 2017, passou quase sem um pio nas ruas, assim como a reforma da Previdência de 2019. O maior movimento trabalhista recente foi a greve dos caminhoneiros de 2018. Sim, era isso também, greve, além de locaute e ensaio geral de organização da extrema direita.
O Brasil tinha em março passado cerca de 100 milhões de pessoas com algum emprego. O trabalho ainda deveria ser assunto central da esquerda, que, no entanto, se ocupa de outras conversas, ao menos as esquerdas de salão e redes sociais. As demais não têm sucesso de público ou crítica.
VIRARAM “MEI” – Muitos trabalhadores se tornaram “MEI” (microempreendedor individual), formalmente ou na prática. Desconfiam do Estado, que muita vez lhes aparece como uma burocracia que custa caro em regulamentações e impostos e não oferece nada de valioso em troca.
É o caso do 1,7 milhão de pessoas que se empregam como motoristas ou entregadores de aplicativo, segundo pesquisa do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) e da Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia), de 2023.
No total, há mais de 13 milhões de MEIs, 9% deles cabeleireiras e trabalhadores da estética (dados de 2021, do IBGE, o mais recente). Uma categoria grande de trabalhadores, quase sempre trabalhadoras, são os empregados domésticos, 5,9 milhões, 75% delas sem carteira assinada (dados da Pnad do IBGE de março deste 2024).
POR CONTA PRÓPRIA – Outros 19 milhões de pessoas trabalham “por conta própria”, segundo também o IBGE, e sem qualquer registro formal (sem CNPJ). É o mundo dos bicos mais precários. Quem da política fala com essas pessoas?
No setor privado, são 38 milhões de trabalhadores na CLT (afora os domésticos), a maioria em comércio e serviços, parte deles um dia organizada em sindicatos com alguma relevância política. Cadê seus representantes, cadê suas queixas? Para os terceirizados e pulverizados, a representação institucional é ainda