Bernardo Mello Franco
O Globo
Lula está com pressa. Na terça-feira, o presidente disse aos ministros que o mandato é “muito curto”. Acrescentou que quatro anos passam “rapidíssimo” para quem está no poder. “Nós não temos muito tempo para ficar pensando no que fazer. Temos que fazer”, cobrou.
O petista está preocupado com o calendário. Sabe que se aproxima dos cem dias de mandato. A data costuma marcar o primeiro balanço de um novo governo. É quando a imprensa e a sociedade começam a comparar o que foi prometido ao que foi entregue.
RECICLANDO PROGRAMAS – Lula informou que deve celebrar a efeméride com um pronunciamento na TV. Se o discurso fosse ao ar hoje, teria ares de “Vale a pena ver de novo”. Até aqui, o governo apresentou poucas novidades. Preferiu apostar na reciclagem de velhos programas.
Em fevereiro, o presidente relançou o Minha Casa Minha Vida. No início de março, recriou o Bolsa Família. Na semana passada, ressuscitou o Pronasci. Amanhã fará uma solenidade para anunciar a volta do Mais Médicos.
Em alguns casos, a retomada de políticas públicas é bem-vinda. Jair Bolsonaro interrompeu iniciativas bem-sucedidas por pura birra. Além de trocar de nome, os programas pioraram. O Auxílio Brasil, que substituiu o Bolsa Família, deixou de exigir a vacinação das crianças.
A aposta em slogans antigos não é um mal em si. O problema é querer apoiar o novo governo em pilares fincados há duas décadas. O país mudou. As demandas do eleitorado, também.
DE VOLTA AO PASSADO – Fórmulas que deram certo em 2003 podem não produzir os mesmos efeitos em 2023. A campanha já havia indicado uma inclinação do PT ao passadismo. Os comícios foram embalados com o jingle de 1989. Sem medo de ser feliz, a militância vestiu camisetas com a foto do jovem Lula no Dops. A nostalgia pode ter rendido votos, mas já passou da hora de tirar os olhos do retrovisor.
Ao investir na tática da reprise, o governo também deixa de aprender com erros pretéritos. Arquitetos e urbanistas cansaram de apontar falhas no Minha Casa Minha Vida. Criticaram a má qualidade das construções, a escolha de terrenos distantes dos postos de trabalho, a escassez de creches, escolas e áreas de lazer.
Ao relançar o programa, Lula não apresentou solução para nenhum desses problemas. O presidente subiu no palanque e enalteceu um passado idealizado. “A gente vai voltar a sorrir, a gente vai voltar a ter esperança, a gente vai voltar a ter alegria”, prometeu.
OUTRO ASSUNTO IMPORTANTE – O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, encaminhou ao Conselho de Ética da Câmara indícios de crimes praticados pelo deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB). O bolsonarista usou as redes sociais para incitar os atos golpistas de 8 de janeiro.
“Era previsível a população não aceitar pacificamente”, escreveu, enquanto correligionários depredavam as sedes dos Três Poderes. Em outro tuíte, ele inflamou a turba contra o presidente do Senado.
O Congresso tem o dever de cassar parlamentares que conspiram para fechá-lo. Punir quem prega a ditadura é um ato de legítima defesa da democracia.