
J.R. Guzzo
Estadão

A única questão que de fato interessou os atores da vida pública brasileira nos últimos dois anos, e que como sempre não teve nada a ver com qualquer necessidade real do País neste período de tempo, chegou enfim aos seus melhores momentos. Já foram os gols, os pênaltis e as corridinhas do juiz para o VAR; agora, é esperar que acabe a transmissão.
Como estamos no Brasil, o jogo já estava com o resultado acertado antes de começar. Ainda falta aparecer no placar do estádio, mas pelo que está dando para se entender, foi STF 4 x Bolsonaro 1, com viés de 5 x 0.
INIMIGO POLÍTICO – A partida vem sendo uma dessas coisas da política brasileira desde a “redemocratização”: não há adversário político, e sim inimigo a ser abatido a qualquer custo, como é o caso, o tempo todo, nessas ditaduras de fim de mundo que se espalham por aí afora.
O inimigo da ocasião, ou homem marcado para morrer, é Bolsonaro. O pelotão de fuzilamento é o consórcio Lula-STF. Decidiram que ele tem de ser banido da vida política do país. E está chegando a hora de executar a sentença de condenação.
É uma comédia que tenta dar a si própria a cara de julgamento segundo os ritos da lei, com inquérito policial, denúncia do Ministério Público, juízes, testemunhas e até advogados de defesa. Mas, no mundo dos fatos, sempre foi uma operação de vingança política por parte de quem tem a força armada a seu favor.
JOGO JOGADO – Como o jogo ainda oficialmente não acabou, a prudência recomenda esperar. Mas a menos que a arbitragem mude de ideia, o desfecho já está pronto.
O público pagante pôde ver, nestes últimos dias, os movimentos finais da partida. Foi interrogada, enfim, a testemunha-bomba da acusação – o tenente-coronel Cid, que há dois anos aparece na mídia como o homem que iria provar, acima de qualquer dúvida, que Bolsonaro pensou, ou quis, ou preparou, ou tentou, dar um golpe de Estado.
Apareceu, enfim, a prova-bomba do MP, a “minuta do golpe” – ou melhor, não apareceu, mas foi oficialmente apresentada à plateia como se fosse mesmo uma prova-bomba. Veio à linha de frente, enfim, o réu-bomba em pessoa, Jair Bolsonaro.

POTÊNCIA ZERO – Tudo isso somado, em termos do que realmente tinha de aparecer – provas materiais do crime e da culpa dos acusados – rendeu zero elevado à potência zero. Cid disse “não” a quase tudo o que lhe perguntaram – ou então que não se lembrava mais, não poderia dizer, não tinha visto.
Não provou o pouco que disse – ficou a sua palavra contra a palavra dos outros. A “minuta do golpe”, agora de forma oficial, não existe no mundo da matéria: não está nos autos, não tem autor, não é assinada por ninguém.
Tudo o que sabe é o que a polícia e a PGR Tribuna da Internetdizem dela: um desfile (“em mau português”, na opinião de Cid) de suposições sobre a viabilidade de se solicitar ao Congresso, conforme está na Constituição, um estado de sítio, ou de defesa, que levaria a uma nova eleição em 2022.
NÃO HOUVE GOLPE – O único fato realmente indiscutível a respeito, além da inexistência física da “minuta”, é que não foi assinado, nem apresentado, nem requerido e muito menos executado qualquer estado de sítio. Não se suspendeu a eleição. Não aconteceu nada. Falaram do que poderia ter sido feito. Não fizeram nada do que se falou.
Quanto a alguma prova séria sobre a tentativa de “golpe armado” e sobre a culpa que Bolsonaro teria tido nela, o depoimento supostamente fatal do ex-presidente em juízo acrescentou nada ao nada que existia até agora.
Na verdade, ele repetiu que depois da eleição só se manifestou contra a intervenção militar ou outras viradas de mesa. Não foi contestado em nada do que disse pelo MP, nem desmentido com algum fato pelos interrogadores.
TRIBUNAL OU FACÇÃO – Só que tudo isso, na vida real, pode não ter nenhuma relevância para o STF. Quem acha que a nossa “suprema corte”, como diz Lula, precisa de alguma prova, do apoio da lei ou da mera lógica elementar para fazer o que bem lhe der na telha?
No fim das contas, o que vai decidir a questão não é o devido processo legal; a lei já foi violada dezenas ou centenas de vezes por esse STF desde que deixou de ser um tribunal de justiça para se transformar em facção política.
O que vai decidir tudo é a realidade objetiva na hora de darem a sentença – a sentença para valer. Aí, como diziam os intelectuais de épocas menos estúpidas do que a que vivemos hoje, vai valer a “correlação de forças”. Quem puder mais vai chorar menos.
