
Pedro do Coutto

A inflação brasileira voltou a ganhar fôlego em abril, com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrando avanço de 0,43%, conforme divulgado na última sexta-feira. O resultado, impulsionado principalmente pelos segmentos de alimentação, bebidas, saúde e cuidados pessoais, reacendeu o alerta sobre a trajetória dos preços e trouxe novas dúvidas quanto ao rumo da política monetária.
O que mais chamou a atenção dos analistas, porém, foi o comportamento dos chamados núcleos da inflação — indicadores que excluem itens voláteis para captar tendências mais duradouras. A média desses núcleos avançou 0,50% no mês, sinalizando uma inflação mais resistente do que o esperado.
DEMANDA – Entre os destaques do período, figuram a aceleração nos preços de bens industrializados — puxada por vestuário — e o avanço no setor de serviços, especialmente alimentação fora do lar e serviços pessoais. Esses componentes são tradicionalmente mais sensíveis ao nível de atividade econômica e, portanto, indicam uma demanda ainda aquecida.
Desde o final de 2024, a inflação de serviços tem se mantido elevada, oscilando entre 7,5% e 8% em termos anuais. Essa persistência sugere que o mercado de trabalho segue forte, o que sustenta o consumo das famílias e dificulta o processo de desinflação. Já a alta nos preços de bens industrializados pode refletir tanto o ritmo mais robusto da economia quanto os efeitos residuais da desvalorização cambial observada no fim do ano passado.
Apesar de alguns alívios pontuais — como a queda nos preços das passagens aéreas e o recuo nos alimentos consumidos no domicílio, especialmente os in natura —, o IPCA acumulado em 12 meses subiu para 5,53%, reforçando a percepção de um cenário inflacionário ainda desafiador.

Alimentação e saúde afetam IPCA de abril
FLEXIBILIZAÇÃO MONETÁRIA – Diante desse panorama, economistas avaliam que o ciclo de flexibilização monetária pode ser interrompido. A expectativa majoritária do mercado aponta para uma elevação de 0,25 ponto percentual na taxa Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para 18 de junho.
Em um contexto de inflação resiliente e atividade econômica firme, os dados de abril reforçam a ideia de que o Banco Central poderá adotar uma postura mais cautelosa, adiando eventuais cortes de juros para o último trimestre do ano.
DIAGNÓSTICO – O desempenho do IPCA em abril reforça o diagnóstico de uma inflação estruturalmente mais resistente, em grande parte alimentada por um mercado de trabalho ainda aquecido e pela força do consumo em serviços. A combinação de núcleos inflacionários elevados, aceleração em bens industrializados e ausência de sinais claros de arrefecimento nos componentes cíclicos desenha um cenário que impõe desafios relevantes à condução da política monetária.
A leitura dos dados sugere que o espaço para cortes adicionais na taxa Selic se estreitou substancialmente. Em vez disso, o Banco Central poderá ser compelido a interromper o ciclo de afrouxamento — ou até mesmo reverter parte dele — caso a pressão inflacionária persista nos próximos meses.
A manutenção da credibilidade da autoridade monetária exigirá, neste momento, uma comunicação firme e decisões calibradas com base em dados, evitando alimentar expectativas de acomodação diante de uma inflação que ainda mostra resiliência preocupante.
