
Eliane Cantanhêde
Estadão

A prisão de Fernando Collor joga luzes sobre a corrupção crônica no Brasil e traz de volta o fantasma do petrolão e da Lava Jato que assombra o presidente Lula, derrotado por Collor em 1989. Já presidente, anos depois, Lula desprezou as acusações contra Collor como “politiquices”, disse que ele faria um “mandato extraordinário” ao voltar à cena política como senador e… o premiou com duas diretorias da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras, epicentro do maior escândalo de corrupção da história brasileira.
Collor transformou as diretorias de Operações e de Postos de Serviço da BR num belíssimo balcão de negócios que, segundo investigações da PF e a ação contra ele no Supremo, lhe renderam em torno de R$ 20 milhões em propinas. Até hoje, é inexplicável que o petista Lula tenha dado um presentão desses para um ex-presidente cassado por corrupção, senador inexpressivo e adversário que jogou sujo contra ele. Por que será?
CABIA MAIS UM – O que fica evidente é que, no esquemão da Petrobras, sempre cabia mais um. Filho de político (que matou um colega a tiros no plenário do Senado), Collor foi prefeito de Maceió, governador de Alagoas e venceu a primeira eleição direta após a ditadura militar usando a fantasia de “caçador de marajás”, quando ele próprio era o marajá, de família muito rica, que na juventude ostentava mulheres lindas, carrões e petulância por Brasília.
É o passado fazendo alertas para o presente e o futuro: desconfiem de aventureiros que se arvoram salvadores da Pátria, que se dizem antipolíticos sendo políticos.
Collor sofreu o impeachment, mas foi absolvido pelo Supremo anos depois, cumpriu o prazo de inelegibilidade, virou senador, aproximou-se de Lula, deu-se muito bem na BR e voltou às manchetes policiais e à mira da Justiça em 2015, no auge da Lava Jato, embolado com o PT.
COLEÇÃO DE CARRÕES – Na “Casa da Dinda”, famosa em Brasília, a PF encontrou uma Lamborghini, uma Ferrari e um Porsche. Não é para qualquer um…
É triste, desanimador e também irritante que os dois candidatos do segundo turno da primeira eleição direta pós ditadura tenham sido alvos, ambos, da falecida Lava Jato, envolvendo justamente a Petrobras, principal e mais simbólica estatal brasileira.
A diferença é que Lula foi julgado e condenado, inicialmente, pela primeira instância de Curitiba e pelo juiz Sergio Moro, mas o processo de Collor correu no Supremo.
DESMANCHE – Numa reviravolta histórica, o mesmo Supremo que havia mandado Lula para a prisão pelo triplex do Guarujá concluiu que Curitiba não era o foro adequado, devolveu os processos à estaca zero e abriu caminho para o terceiro mandato e o desmanche da Lava Jato.
Enquanto isso, Collor navegava de recurso em recurso, embargo em embargo, e seu processo só “transitou em julgado” na última quinta-feira, quando o ministro Alexandre de Moraes deu um basta no que conhecemos como “chicana jurídica” – a velha enrolação, ou procrastinação − e mandou prendê-lo.
Assim como traz de volta o fantasma do petrolão assombrando Lula, a prisão de Collor aumenta o pavor de Jair Bolsonaro de parar na cadeia com seu julgamento por tentativa de golpe no STF. Collor remete ao passado, assombra o presente, projeta o futuro e diz muito sobre o Brasil. Por falar nisso, quem mandou matar PC Farias, o “operador” de Collor?
