Carlos Newton
Até os pilotis do prédio do Supremo sabem que é o ministro Gilmar Mendes quem manda por lá, seja no protagonismo ou nos bastidores, não importa. Nenhuma decisão de importância é tomada sem o seu aval. Não é ele que vota com a maioria, muito pelo contrário – é a maioria que vota com ele.
Tem sido assim e não é de agora. Enquanto a Lava Jato atingia apenas o PT e os partidos do Centrão, Gilmar Mendes era entusiasta da Operação. Quando seus amigos tucanos começaram a ser também alvejados, tudo mudou e o ministro passou a atacar implacavelmente a outrora valorosa força-tarefa.
À FRENTE DA CAMPANHA – Os tucanos foram perdendo a força, os movimentos populares exigiam mudanças contra a corrupção, mas mesmo assim Gilmar Mendes tomou a frente da campanha contra a Lava Jato.
Tomou tanto a frente que induziu os colegas ministro e simpatizantes do Partido dos Trabalhadores a criarem condições de unir PSDB e PT num balaio só e tomar o governo das vozes contrárias ao TSF e dos políticos ligados às esquerdas.
Com a eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, o experiente ministro sentiu que ele era incontrolável, inacessível e inadministrável. Foi quando concluiu que era preciso ressuscitar Lula, um político com quem tinha e tem ligações, devido à grande amizade que existia entre dona Marisa Letícia e sua mulher, Guiomar Mendes.
Com a habilidade de sempre, o ministro passou a trabalhar no Supremo pela libertação de Lula, através do fim da prisão após segunda instância, mesmo que isso representasse um vexame internacional, pois em 2019 o Brasil passou a ser o único país da ONU (são 193) a não prender criminosos após decisão colegiada.
DESCONDENAÇÃO – Mas ainda faltava devolver os direitos políticos. Foi quando entrou em ação o relator da Lava Jato, ministro Edson Fachin, que em 2021 tratou de inventar a inexistente “competência territorial absoluta”, para descondenar Lula e possibilitar que se candidatasse. Em tradução simultânea, valia tudo para evitar a reeleição de Bolsonaro.
Logo em seguida, o próprio Gilmar Mendes deu a pá de cal na Lava Jato, ao conseguir aprovar a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro, apesar de seus julgamentos terem sido revalidados em duas instâncias superiores, sempre por unanimidade.
Agora, com Lula no poder, Gilmar Mendes tenta justificar essas armações do Supremo, dizendo que “estávamos lidando com gente do porão”, e assinalando que “descemos na escala da degradação política”.
P.S. 1 – As palavras do ministro são irretocáveis, realmente estávamos lidando com gente do porão. Mas quando ele diz que “descemos na escala da degradação política”, devia acrescentar que caímos muito também na escala da degradação jurídica. Nada justifica que o Supremo desconheça as leis e as reinterprete exclusivamente com motivos políticos. Foi um retrocesso medieval, para quem é realmente democrático.
P.S. 2 – Com essa desprezível e tendenciosa atuação política, o Supremo envergonhou a si mesmo e causou um retrocesso, pois Bolsonaro só teve essa alta votação por causa do repúdio ainda existente contra Lula e o PT. Não era preciso o Supremo ter se envolvido, porque os próprios eleitores se encarregariam de se livrar de Bolsonaro, se não houvesse a polarização.