Eliane Cantanhêde
Estadão
Os domingos foram quentes em janeiro, com posse do presidente Lula, invasão de Planalto, Congresso e Supremo, queda do comandante do Exército e a explosão da tragédia Yanomami. O jogo real, porém, começa em fevereiro, com o reinício dos trabalhos de Judiciário e Legislativo. Que seja a passagem do extraordinário para o cotidiano, por mais que o cotidiano ande muito extraordinário.
A reeleição de Rodrigo Pacheco à presidência do Senado e de Arthur Lira à da Câmara são pule de dez. Ambos têm liderança, se articularam bem, cada um com seus “instrumentos”, e têm apoio de Lula, PT e um amplo leque de partidos, da esquerda à direita. A expectativa é que o governo tenha uma base sólida e a pauta, fortemente econômica, avance. Nem tudo, porém, são flores.
EXTREMA-DIREITA – A bancada bolsonarista vai encolher, na proporção que Jair Bolsonaro míngua, em meio a provas/indícios de envolvimento, senão liderança, em crimes contra a segurança nacional, a vida dos cidadãos na pandemia, as urnas eletrônicas, a Amazônia e os Yanomami.
Mas, mesmo com Bolsonaro frágil, a extrema direita se sente empoderada e será estridente, com Mourão, Moro, Damares, Salles, Pazuello, Zambelli, Kicis, os Bolsonaros. E Weintraubs e Ernesto Araújo correm por fora.
A relação de Lula e Pacheco flui bem, o problema é a ligação excessiva do senador, beirando a dependência, com o antecessor Davi Alcolumbre, que sabe chantagear o Executivo e é bom de orçamentos e atos secretos. Na Câmara, compara-se Lira a Eduardo Cunha, pelo comando e articulação, mas Lula não é Dilma e as confabulações vão de vento em popa com Lira, que sempre apoiou a democracia.
QUESTÃO ECONÔMICA – A questão é a pauta sem clareza de Lula para a economia e Petrobras, governadores (que têm bancadas) ressentindo-se da queda do ICMS dos combustíveis, ministros aflitos com muitas demandas e poucos recursos, mercado com a crise fiscal e sociedade atenta aos frutos sociais.
A reforma tributária, mágica para todos os males, vaga sem rumo há décadas. E como Lula quer se ver no centro da guerra entre União, Estados, municípios e setores privados? E com tantas outras prioridades? No Supremo, a coisa flui bem, ao menos na superfície. A pauta não gera atrito nem tira holofote de Lula e Congresso, e a preocupação é Alexandre de Moraes repetir a Lava Jato e perder a noção de limites.
Xandão, de grande utilidade pública na era da excepcionalidade, precisa se readaptar à normalidade, enquanto os três Poderes depuram o ambiente e amarram o pacote da democracia. Aliás… Cobrar responsabilidades das redes sociais, com certeza. Abrir brechas para censura política, jamais.