Eduardo Affonso
O Globo
Neste domingo, 2 de outubro, ao cair da tarde, teríamos uma boa e uma má notícia. A boa era que poderíamos estar chegando à reta final esta corrida maluca pela Presidência. A má era que ia se aproximando a hora de ter de encarar o segundo governo Bolsonaro ou o terceiro governo Lula.
Vejamos pelo lado bom: não tem como Bolsonaro II ser pior que Bolsonaro I — ainda que lhe sobrem vontade e talento para isso. Mas não há indícios de uma Covid-23, que o ajude a dizimar mais uma parte da população. As instituições já estão vacinadas (e com dose de reforço) contra seu autoritarismo e sua compulsão golpista.
E haverá oposição — daquele tipo que leva adiante pedidos de impeachment e não aposta no “quanto pior, melhor” para depois ficar com o butim da terra arrasada. Oposição como a que o PT sempre fez quando lhe foi conveniente fazer.
ÚLTIMA OPORTUNIDADE – Quanto a Lula III, pode ser sua última oportunidade de não entrar para a História como um Ademar de Barros II, o do “rouba, mas faz”. Lula não tem herdeiros políticos à altura — ele mesmo esterilizou tudo à sua volta para reinar soberano, árvore sob cuja copa nada floresce.
É agora ou nunca para deixar um legado inquestionável, que se sobreponha ao mensalão, ao petrolão, à responsabilidade por nos ter impingido Dilma, ao apoio a ditaduras, ao sítio do amigo etc. Para fazer um ajuste de conduta e não mais tirar dos pobres para dar aos empreiteiros, banqueiros, doleiros e cerverós.
20 ANOS ATRÁS – No seu discurso de posse, 20 anos atrás, Lula I disse que “enquanto houver um irmão brasileiro ou uma irmã brasileira passando fome, teremos motivo de sobra para nos cobrirmos de vergonha”.
A quantos brasileiros não faltariam comida, saúde, educação se tivessem sido investidos em programas sociais os bilhões desviados pelo PT?… E até hoje ninguém do partido se mostrou envergonhado.
Lula I falou em pacto social — e cindiu a sociedade. Falou em combate à corrupção — e produziu uma batelada de escândalos. Falou em derrotar a cultura da impunidade — e ei-lo aí, impune.
TUDO AO CONTRÁRIO – Já Bolsonaro, há quatro anos, disse “vamos unir o povo” — e potencializou a desunião; “valorizar a família” — devia estar se referindo à sua própria; “respeitar as religiões” — e demonizou o Estado laico.
Falou em “restaurar e reerguer nossa pátria, libertando-a, definitivamente, do jugo da corrupção, da criminalidade, da irresponsabilidade econômica e da submissão ideológica” — e fez, minuciosamente, o contrário.
No final do segundo turno, saberemos o que nossa democracia terá de enfrentar — se a investida daquele que quer colocá-la abaixo ou do outro que pretende miná-la por dentro. Em qual vice prestar atenção — se no neossocialista Alckmin ou no “cumpridor de ordens” Braga Netto. Se teremos de nos conformar à linguagem rasa ou à chula.
A PROFESSIA DE DILMA – Talvez seja mesmo hora de pedir perdão à Dilma — não pelas críticas, mas por termos duvidado de sua sapiência.
Ela cravou, em 2010: — Não acho que quem ganhar ou quem perder, nem quem ganhar nem perder, vai ganhar ou perder. Vai todo mundo perder.
Neste domingo, com o resultado das urnas eletrônicas, sua profecia realmente se cumpriu.